domingo, 3 de agosto de 2008

Duas vidas dedicadas ao Ballet - parte 2


Albertina Saikowska e seu irmão Aleksander Saikowsky


Começou assim:

Mamãe nasceu em Tibilisi, no Cáucaso Russo, entre o Mar Negro e o Mar Cáspio.
Não sei muito bem a história e me arrependo muito de nunca ter me interessado de conhecer a história completa de minha família, tanto pelo lado de mamãe como a do papai que também foi muito interessante.
Acho que quase todos somos assim, não conhecemos a árvore genealógica da família, mas foi uma pena , quando tive a oportunidade de conhecer, com vovô, vovó, todos vivos, não me interessei, agora não tenho mais ninguém que conheça realmente a história.
Mas vou contar o pouco que sei.
Vovô era oficial do Czar Nicolau II , (aquele, da Anastácia...) Capitão, para ser mais precisa,
( papai o chamava de “capitão Boleslaw”)
Devia ter muita bravura, pois tenho uma foto dele cheio de medalhas no peito.
Sei que ele lutou na guerra da Criméia ( russos contra os turcos ), vovó contava que em determinada faze da guerra, ele era o responsável por um campo de prisioneiros turcos, e ele era bom, respeitava os presos. Depois, de uma reviravolta na guerra, a situação reverteu, e os turcos prenderam alguns oficiais russos, entre eles meu avô.
Os turcos fizeram os russos andarem na neve, descalços,( com certeza muitos perderam os pés com cangrena), mas vovô andou com as botas, e se salvou de ter os pés amputados.
Um dos turcos reconheceu meu avô e falou aos outros que ele tinha sido bom na prisão, então pouparam ele.
Com exemplos como este é que fui criada, dando valor a bondade e honestidade.
Bem, voltando à mamãe....... quando ela tinha meses, vovô teve de fugir da rússia, ( estava implantado o regime bolchevique).
Vovó contava que eles foram para a Polônia primeiro, pois vovô tinha herdado um sitio que era da família, aproveitaram para morar. Mas era inverno, não tinham o que comer, só tinham macieiras plantadas no sitio. Na época da revolução bolchevista todos passaram muita fome, a família de mamãe só comia maçãs. Mamãe enjoou de tal forma, que só foi comer uma maçã, quando eu já era adolescente. Me lembro bem! ,
Meu avô vendeu o sitio, mas o dinheiro tinha desvalorizado tanto que não adiantou nada, não valia nada! Ele até nos deu muitos “rublos” da época que eu ainda tenho. Foram então para a Lituania, onde já vivia tia Zeferina, a irmã mais velha de mamãe, casada com o filho do prefeito de uma cidadezinha. Fugiram em um vagão de gado ( como no filme Dr Jivago ) .
Mamãe tinha 4 irmãos, Zeferina (que sempre chamei de tia Ira), Lílian, Jadwiga ( que sempre chamei de tia Lídia ) Alexander ( que sempre chamei de tio Sacha) e Albertina ( mamãe).
Ficaram uns 8 anos entre Lituânia e Polonia.
Um namorado de tia Lídia, que era polonês, soube que o Brasil estava aceitando imigrantes estrangeiros para trabalharem, então vovô se animou para trazer a família, a situação lá estava cada vez pior. Foram para Lion, um grande porto na França, para esperarem o navio.
Mas só veio vovô com tio Sacha, na época um adolescente, e tio Henrique, que era o namorado de tia Lídia e que depois se casou com ela. Vovó, tia Ira ( já tinha se separado do marido que era alcoólatra) Lídia e mamãe, ficaram em Lion, ( a outra filha, Lílian, já era uma bailarina famosa e não veio, fui conhecê-la em 1950, no Rio de Janeiro nas bodas de ouro de meus avós).
Enquanto vovó esperava em Lion, vovô, no Brasil procurava um trabalho.
Ele sempre foi militar, não sabia fazer outra coisa, foi muito difícil para ele mudar de vida, de pais, mas sempre foram muito gratos ao Brasil. Vovó dizia que o Brasil era uma terra abençoada. Aqui nunca nevava, as árvores estavam sempre verdes, tudo é muito colorido. Me ensinou a ser orgulhosa de minha terra.
Eles eram mais patriotas que muitos brasileiros.
Quem achou primeiro um emprego foi tio Henrique, como era marcineiro e marcheteiro,
conseguiu serviço na Fábrica Brunswick de Bilhares, que era de poloneses, e conseguiu para vovô e tio Sacha, lá também.
Vovô levou quatro meses para poder trazer a família para o Brasil. Ficaram no Rio de Janeiro, onde era a fábrica.